O positivismo moralista apresenta três argumentos a favor do dever categórico de obediência jurídica. Primeiro, a obediência à lei promove a ordem social; sem ela, teríamos anarquia. Segundo, a obediência promove a imparcialidade; obtemos os benefícios da obediência de outras pessoas, de modo que, em troca, devemos dar-lhes os benefícios de nossa obediência. Terceiro, a obediência promove a democracia; as leis são feitas de acordo com os procedimentos de representação e responsabilidade populares que lhes dão o direito ao respeito.
Esses argumentos poderiam ser persuasivos em confronto com uma posição que afirma que se deve desobedecer categoricamente a lei, mas ninguém jamais sustentou tal posição. Contra as várias posições de desobediência seletiva, tais como as que consideraremos em breve, elas não são persuasivas. O problema com os argumentos é que cada um se baseia em um recurso a um valor que não se alinha coerentemente com os critérios jurisdicionais de legalidade do positivista. Seja como for que o positivista especifique os seus critérios, sempre haverá situações particulares em que a ordem social, a imparcialidade ou a democracia não serão servidas pela obediência ao que os critérios do positivista identificam como lei.
Com que frequência tais situações surgem dependerá de como o positivista define os seus critérios jurisdicionais. Por exemplo, alguns positivistas são literalistas que insistem em interpretar estreitamente as normas que identificam como lei. Outros, porém, prescrevem que as normas sejam interpretadas à luz de seus propósitos ou princípios subjacentes (talvez baseados na teoria de que o soberano pretende isso ou que simplesmente decretou tais valores como lei). Naturalmente, quanto mais os critérios do positivista permitem recorrer a tais normas de base, menos provável será que suas interpretações estejam em tensão com a norma. Mas insistir em alguma distinção entre lei e outros tipos de normas é que significa ser um positivista. Portanto, todos os positivistas irão encontrar-se, às vezes, em situações de tensão que identificam como legais e outras normas.
Extraído de “A prática da justiça: uma teoria da ética dos advogados”, de William H. Simon; São Paulo, 2.001, Martins Fontes, páginas 124 e 125.

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