Quando escrevi sobre a série SUITS discorri um pouco acerca da doutrina das ordenações e vocações de Deus para o homem, de modo que em diferentes áreas da vida eles se coloquem como se ocupassem um posto que não se deve abandonar, mas cultivar e guarnecer. Naquele texto falei como, dentre outros, programas motivacionais e de ‘coach’ oferecem propostas que – alfim – terminam por ser naturalizações da teologia da vocação.
Na verdade, o conceito teológico de vocação é um desdobramento da doutrina da Redenção e, na prática cristã, a vocação é uma forma de viver a fé na obra Redentora de Cristo em diferentes esferas da vida, incluindo o trabalho e a vida profissional. Embora bem sistematizado por João Calvino, encontramos entre os católicos perspectiva assemelhada: São Bento, Inácio de Loyola e, recentemente, José Maria Escrivá de Balaguer destacam o trabalho como ocasião, instrumento e meio de santificação. Com o processo de secularização a prática cristã da vocação e ordenação perdeu seu sentido para os secularizados e criou um vácuo que – contemporaneamente – é ocupado pela participação em programas motivacionais e de coaching.
Os processos disruptivos da Quarta Revolução Industrial que vivemos são um desafio de contextualização teológica da doutrina da vocação.
A questão também se agrava com a influência gramsciana: o expansionismo estatal que castra as vocações (reduzindo o sucesso aos certames de empregos públicos) e com a ilusão hollywoodiana muito bem sintetizada no discurso de Tyler Durden no filme O Clube da Luta:
Na verdade, algumas camadas de ideias erradas acerca do trabalho devem ser desfeitas na cabeça dos crentes evangélicos – sobretudo os jovens – para que eles possam entender o que é vocação e, então, vivê-la contraculturalmente em sua vida profissional.
Enquanto os líderes cristãos não se conscientizarem que as pessoas vão atrás da grama sintética do coaching por que a grama verde da doutrina da vocação não é oferecida aos cristãos sob seus cuidados, não vai adiantar nada vociferar e escrever textos contra a prática do coaching. A luta contra a secularização é pressuposicional, inclusive nesse caso.

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