O jornalista Paulo Henrique Amorim faleceu e muitos comemoraram isso pois ele tinha umas defesas muito radicais de ideias e práticas esquerdistas. Inclusive pesavam sobre eles acusações de receber dinheiro público durante os governos de esquerda para promovê-los. Um mal estar me tomou quando li nas redes sociais o gozo da morte dele por alguns internautas, inclusive cristãos. Cabe a reflexão pois a meditação sobre a morte é uma devoção milenar própria do cristão.
Há mais sabedoria na casa onde há luto do que naquela onde há festa – está em algum lugar de Provérbios de Salomão. Por isso devemos sempre voltar ao tema da morte em nossas meditações e devocionais. Hospitais, enterros, velórios, parente cancerosos e terminais são convocações de Deus para nós para que aprofundemos nossa relação com Ele. E isso não só para nos lembrarmos da finitude e brevidade da vida, suas vaidades, e fugacidade de suas concupiscências – mas também da soberda da vida.
Uma grande preocupação pessoal dos últimos tempos é o enredamento da devoção cristã pela guerra cultural. Num aspecto, a guerra cultural (necessária), parece afastar dos cristãos a mentalidade peregrina que eles devem ter. Noutro aspecto, parece que a guerra cultural tem deslocado a prática devocional dos crentes apenas para os aspectos externos, isto é, moralidade – e o pior, degenerando tal importante aspecto (o testemunho de vida compatível com o Evangelho) em moralismo.
É uma cilada do diabo muito antiga – chama-se soberba da vida – citada por João em sua primeira Epístola, se não me engano. A expressão que melhor expressa o seu sentido é aquela que diz “soberba de uma boa vida” – isto é, uma vida vivida sem ser dominada pela concupiscência da carne e pela concupiscência dos olhos (sem imoralidade), de decisões aparentemente corretas e de bom resultados, porém fundadas na auto justiça e consequentemente levando ao desprezo do outro. Isso não procede do Pai, conforme o próprio João falou. Lutero escreveu certa vez que a soberba da vida nasce da vitória sobre os próprio vícios através de práticas com aparência de piedade mas que, por não reconhecerem nem procederem da Divindade como sua doadora e efetivadora são o vício mais difícil e indestrutível – o vício de ocupar o lugar de Deus.
É isso que me salta aos olhos – cada vez que exultamos com a morte de Paulo Henrique Amorim ou de alguém que não gostamos ou que nos fez mal estamos evidenciando um grau bem elevado de justiça própria. É a devocional dos fariseus – é comer e beber o sangue do adverso e não de Cristo.
Eu gosto de pensar no que o Apóstolo Paulo escreveu sobre os judeus – sim, os judeus que o perseguiram, difamaram, maltrataram, e tentaram matar – em algum lugar no meio da Epístola aos Romanos: Paulo diz que, se Deus permitisse, abriria mão de sua própria salvação e passaria a eternidade no inferno em troca da salvação de seus irmãos nacionais. Também penso no Rei Davi, no seu Cântico do Arco, em que lamenta a morte de Saul e fala do que ele fez de bom para os hebreus. Sim, lamenta a morte do homem que mandou matá-lo, que o perseguiu e fez passar as piores situações. Sim, meus irmãos: a morte de quem amamos e que nos amou traz ocasião de consolação; mas a morte de quem não gostamos e nos fez mal traz ocasião para crescimento espiritual perante Deus.

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