BLOG CASTRO MAGALHÃES

Editor: Carlos HB de Castro Magalhães (MTb 0044864/RJ)

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Eu li o Salmo 39 e resolvi estudá-lo quando, meses atrás, vi uma placa preta com a inscrição “Salmo 39.9” em neon vermelho. Procurei o verso na Bíblia e o li: “Emudeço, não abro os lábios, porque tu fizeste isso”.

Desde então penso nesse salmo, e de quando em quando leio um comentário ou outro dele; interessei-me pelo seu autor (o Rei Davi) e pelo seu músico (Etã, ou Jedutum). Busquei saber em que situação da vida de Davi esse poema foi escrito, mas não consegui saber – apenas alguns indicativos. Dessa reflexão, extraí que se trata de um texto sobre impenitência pública.

O Salmo começa com a ruptura, pelo salmista, de qualquer diálogo com os impios, inclusive a respeito do bem (versos 1 e 2). Ao emudecer e ficar em silêncio acerca do bem (verso 3, edição NARA), o salmista parece deixar de ter relevância social, visto que concomitante ao seu silêncio os ímpios prosperam (verso 3, Bíblia de Jerusalém: “vendo a sua sorte” [a dos ímpios]) e isso causa nele profunda dor. Essa dor indica uma ideia de destruição da capacidade intelectual de sustentar a ideia de Bem (enquanto eu meditava, um fogo acendeu-se no meu coração (lembrando que no hebraico coração indica entendimento, pensamento e não emoção)) O tema da prosperidade dos ímpios se repete em outros salmos, p. ex., Salmo 73, mas aqui parece ter uma dimensão pública. Na verdade, é um silêncio do Salmista diante de Deus, para que, no diálogo com os ímpios, não venha a pecar contra Deus.

O salmista, então, reconhece a sua fragilidade (verso 4) e a sua pequeneza perante Deus; não só sua, mas também de todo ser humano, inclusive os ímpios com os quais deixou de falar (verso 6). Ele concluí acerca da inutilidade da boa sorte dos ímpios (‘amontoa tesouros e não sabem quem ficará com eles‘), subentendendo que o ímpio não pode controlar a história e determinar o futuro.

Depois disto, o salmista reconhece a ignorância dessa condição como um flagelo: “livra-me de todas a minhas iniquidades” – verso 8; isso tem um caráter não só de penitência interna, pessoal e íntima – mas também de – em sendo o salmista uma pessoa crente no Bem – não seja ele (e o Bem) zombado pelos ímpios (verso 8); isto é, há um caráter público de defesa do Bem.

Emudeço, não abro os lábios, porque tu fizeste isso” é uma oração de reconhecimento do salmista do flagelo que Deus lhe aplicava; conversar com os ímpios (não emudecer), seria corromper-se de modo a não enxergar o flagelo que Deus havia derramado sobre ele salmista, justamente para induzí-lo à confissão (versos 10 e 11). Há alguns que falam que neste Salmo Davi refere-se à guerra civil promovida por seu filho Absalão, que culmina na morte deste (“quando castigas alguém…destróis nele…o que tem de mais precioso”).

É possível, podemos elocubrar, algum evento político na motivação desse salmo, vez que foi entregue para ser entoado nos cultos dos hebreus a um outro homem com uma história familiar politicamente trágica. Na verdade, Jedutum, também chamado Etã, era neto do profeta Samuel, último juiz de Israel, ou, em linguagem moderna, último juiz do período da República dos Hebreus; este Samuel foi sucedido por seus dois filhos, que eram tão corruptos que o povo os rejeitou, ocasionando a mudança do regime em Israel para a Monarquia, com a unção de Saul como Rei. Então, o Salmo 39 foi escrito por um rei que sofreu uma tentativa de golpe de Estado do próprio filho; e era executado como música por um homem que era filho de juízes tão corruptos que o povo os rejeitou e mudou a forma de governo para não ser julgado por eles. Esses senhores receberam de Deus esse encargo de, pela sua arte – e este é o contexto histórico redentivo do Salmo -, apontar para a obra Redentora de Cristo, pelo qual Deus dirige e sustenta Ele mesmo o Bem na história humana.

Do Salmo, o que aplicamos para nós é o não contaminar-se com os argumentos que conduzem à relativização daquilo que é condenado por Deus – inclusive na esfera pública: aspectos dos mecanismos jurídicos, políticos e burocráticos que servem para justificar e manter a iniquidade são relativizações e foram condenados por Jesus nos escribas e fariseus.

Implícito nessa ruptura do diálogo está a indicação da perniciosidade do êxito dos que praticam o mal: o exemplo deles é deletério, seduzindo o salmista (que precisa romper com eles para não se contaminar) e arrastando os insensatos para a vida de iniquidade. Isso atrai o flagelo de Deus; isso também indica que Deus pune os exemplos sociais de estímulo à impunidade, ao mal e à corrupção.

Não devemos relativizar o Bem em razão da manipulação farisaica do processo legislativo; não devemos ouvir os argumentos que dizem que a lei que impede os juízes e integrantes do aparato repressor de fazer o seu trabalho com independência e tranquilidade é certa e deve ser obedecida pelo simples fato de ter passado no Congresso Nacional. Aceitá-la e crer nela é destruir a capacidade cognitiva em relação ao Bem e ao Belo, é incendiar o entendimento, e causar dano cerebral no povo. Quando o flagelo atingir esse Congresso, não devemos falar nada, devemos emudecer, e não dialogar com ele.


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