O Brasil escandaliza-se com reportagem de o “Fantástico” que levou a sociedade a compadecer-se da transsexual “Susy” mas omitiu ser a mesma um pedófilo que estuprou e matou uma criança de 9 anos, além de abusar de outras. A omissão foi considerada e com fins manipuladores.
Há 8 anos presa a transsexual Susy nunca recebeu uma visita. A questão que se coloca é a seguinte: qual o limite da empatia? Até onde devemos nos colocar no lugar dela e projetar em nós mesmos o sentimento de solidão que ela tem?
É sabido que os transsexuais são muito ignorados por suas famílias, e não precisamos explicar muito isso; por outro lado, sentimos de modo geral uma repulsa natural por transsexuais – e desde que isso não nos leve a desrespeitá-los e discriminá-los, tudo bem. Na ação cristã, em havendo a oportunidade de por eles fazermos caridade, o devemos. Mas que tipo de discernimento moral devemos fazer de um transsexual pedófilo que matou uma criança e como isso afeta nossa empatia por ele?
Julgar moralmente o outro é um dever cristão muito impopular e incompreendido por causa de entendimento equivocado sobre o “não julgueis” de Jesus. Ele e os apóstolos mandaram discernir a conduta dos outros homens e o fizeram. O homem de hoje, encapsulado num processo histórico temporal, não tem como transcender e por isso só pode compreender o exercício da misericórdia como um dever de solidariedade obrigatório por contrato social e/ou obrigatório pelo Estado. Nesse sentido, Susy deve obrigatoriamente ser percebida e considerada como pessoa, ainda que tenha matado uma criança de 9 anos e seus pais estejam esquecidos em sua dor. Nesse processo, não se há de discerni-la moralmente, pois o Estado é imanente e a moralidade da sociedade (embora majoritariamente cristã) é transcendente. Eis o fracasso do estatismo iluminista ocidental, abandonando o homem em sua universalidade e reduzindo-o apenas ao momento material, histórico e temporal.
A moralidade estatal – de perdão realizado pelo cumprimento da pena – não pode ser imposta à sociedade. O que Draúzio Varela e o Fantástico quiseram fazer foi isso: despertar compaixão e empatia por uma pessoa que pagava seus pecados cumprindo uma pena. Até aí, nada demais; o problema é que para esse tipo de perdão ex congrua ser elemento a permitir a compaixão das pessoas, foi necessário omitir toda a história: os crimes bárbaros cometidos por Susy e a dor esquecida dos familiares de sua vítima. O motivo da omissão é óbvio: esta superioridade moral dos estatistas não é tão superior assim, mas anã e sem estatura para enxergar o verdadeiro alcance da alma humana, sem pernas para persegui-la e sem braços longos e fortes para agarrá-la.
Thomas Watson, o velho puritano, em seu A Doutrina do Arrependimento, diz que este é uma qualificadora: o arrependimento qualifica uma pessoa a receber misericórdia; não significa que vá realmente causar o recebimento desta. Ele também ensina, falando sobre a natureza do arrependimento, que o verdadeiro arrependimento se junta à restituição – podemos entender que o verdadeiro arrependimento ao menos fará o arrependido não mais causar dor nas vítimas do seu pecado. É possível ver isso na conduta de Susy? Enxergamos isso em nós?
Igualmente, o verdadeiro arrependimento faz que – tanto dos atos pecaminosos quanto das consequências do mesmo – o arrependimento culpe intensamente a si mesmo e não aos outros. Não há, aí, para o verdadeiro arrependido, espaço para vitimismo e auto-comiseração. Enxergamos isso em Susy? Enxergamos isso em nós?
O ódio pelo pecado que o levou à desgraça é uma marca do verdadeiro arrependido. A pulsão sexual desordenada ocupou toda a personalidade de Susy a ponto de ela definir-se socialmente como uma mulher trans, embora tenha nascido homem. Não sejamos radicais como Orígenes, que a si mesmo castrou-se para escapar aos seus desejos de fornicação; mas se a libido desordenada leva alguém a cometer um pecado, esse alguém, se arrependido, há de fazer do enquadramento dela uma luta de sua vida. O penitente é como Sansão, que se vinga de seus pecados matando-os às próprias custas (Gálatas 5.24). Num outro trecho, falando sobre as provas do pecado, Watson diz que o verdadeiro arrependido se indigna com o pecado de que se arrependeu. Vemos isso em nós? Ou só na Susy? É discernindo moralmente os outros que julgamos a nós mesmos em nossas consciências.
A única forma de termos empatia com Susy é reconhecendo a nossa condição de pecadores; a única forma de compreendê-la é discernindo-a moralmente – numa perspectiva bíblica – para vermos os nossos pecados e fugirmos de fazer o que ela fez com os dela (esteja certo, ela amou os pecados dela como amamos muito dos nossos). Mas para isso, é preciso ver os pecados e reconhecê-los. Isso, a moralidade da mídia não pode fazer. Ela vai ocultá-los. E não será num mar de esquecimento (Miqueias 7.19)

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