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Editor: Carlos HB de Castro Magalhães (MTb 0044864/RJ)

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O monofisismo e o antinomismo seduzem os crentes brasileiros. O monofisismo é aquela heresia que foi excluída da igreja Ocidental no Concílio de Calcedônia e que consiste em declarar que em Cristo a natureza humana e divina se confundemm. Essa crença bem fortalecia a ideia do imperador homem-deus – de que o próprio imperador podia ser um Cristo – como vimos no Domiciano do período do Apocalipse.

Já o antinomismo estabelece-se no Concílio de Trento, na chamada “Controvérsia do Senhorio”, em que pelagianismo estabelece-se como doutrina da igreja de Roma, fixando a cooperação e coexistência de duas condições ou princípios opostos: a vontade e o intelecto decaídos, de um lado, e a Graça, de outro, ambos cooperando entre si: ao invés da salvação pela fé somente, a impossível cooperação do corpo do pecado com a Graça de Deus para que o homem seja salvo.

O antinomismo – a convivência de opostos contra um princípio único regente – acaba por, em prática, transformar-se (quando aplicado à doutrina da Graça) na exclusão do Velho Testamento, especificamente na exclusão Lei Moral – naquilo que Dietrich Bonhoeffer denominou de prevalência da graça barata. O antinomismo foi o lugar de morada dos dissensos e dissidências, dentro da igreja cristã, no qual aportaram os que consideravam a moralidade cristã pejorativamente ou a negavam, incluindo, aí, os Revolucionários do século 18.

Não é outro o caso de Edmund Blake, que em seu poema “Jerusalém”, bem coloca a Inglaterra como a Cidade Celestial das liberdades, berço do progresso, usando um vocabulário bíblico teológico que chega a enganar os incautos e desavisados. Como centro da Graça, a partir da Inglaterra o mundo seria mudado em sua moralidade, as pessoas seriam libertas do temor da Lei Moral. O poema foi musicado e faz parte do hinário anglicano, mesmo composto por um dissidente revolucionário, e foi cantado por um dos netos da Rainha Elizabeth quando casou. Também foi gravado e apresentado em inúmeros shows pela banda de rock progressivo Emerson, Lake and Palmer, com grande popularidade, como se pode ouvir em rápida busca no Youtube.

Esse fato do poema de Blake ilustra o denunciado por Francis Schaeffer em seu livro “A Igreja do Final do Século 20”: o uso de vocabulário teológico despido de seu significado real mas incorporando um novo significado. Essa ideia e prática revolucionária se estabeleceria e constituiria um dos elementos de amparo da imposição da democracia como contribuição cristã ao redor do mundo, fazendo as pessoas enxergarem a democracia como o cristianismo em sua forma natural – o que não se vê na Bíblia e na história da igreja. De qualquer modo, é evidente que quanto mais se aprofundou nesse conceito mais a moralidade dos países outrora cristãos foi corroída, inclusive das igrejas, cheias de imoralidade.

A tentação antinomiana é esta de considerarmos a democracia como parte do credo cristão – o que nos torna tíbios em relação a elementos de nossa moralidade bíblica culturalmente antidemocráticos. Não só isso, mas pior, é a ideia de que jogando o jogo democrático estamos sendo bons cristãos e que o ethos cristão é o mesmo ou deve coincidir e ser concorde com o da democracia – o que é uma falácia revolucionária. Nos submetemos, por ordem bíblica, a toda autoridade instalada – inclusive as instaladas democraticamente – mas não mudamos nossa fé para concordar com as bases doutrinárias que a legitimam. Os sistemas político-sociais, os Estados, os países e as nações também, são experimentos humanos transitórios, mas o Reino de Deus é eterno. Há cristãos e igrejas verdadeiras vivendo em sistemas islâmicos, entre as castas indianas, no meio da sociedade maoista/confucionista dos chineses e entre/nos mais diferentes lugares e sistemas de pensamento.

O monofisismo ganhou força com a utilização do corpo doutrinário do cristianismo ortodoxo da igreja oriental como arma de guerra, principalmente por Alexandr Duguin, conselheiro do presidente russo Vladimir Putin. O russo vê a nação como igreja, pois ele vê as naturezas humana e divina de Cristo como misturadas e mescladas, confundindo-se o humano e o divino. Ele não consegue enxergar os atributos divinos (inclusive os morais) como destacados do ser humano. Isso explica muita coisa sobre o sentimento de onipotência e onisciência de muitos de seus governantes e a receptividade positiva às atrocidades tidas como “purificadoras” no passado – e também no presente.

No Brasil o monofisismo, embora não estabelecido, apresenta alguns traços e encontra expressão pela pregação principalmente dos RadTrads, os radicais tradicionalistas de inspiração ortodoxa. Vemos a ideia de “Bem contra o Mal” presente nas disputas eleitorais e a referência a candidatos como “homens de Deus” como indicativos da confusão entre a natureza humana e divina. Colateralmente, apontam para o pensamento maniqueísta, incompatível com a fé cristã. O cristão não tem o direito de pensar que há uma luta entre o Bem e o Mal. O Mal não disputa com Deus. Deus o tem sob controle como um dono traz o seu cachorro na coleira.

Enfim, em ano de disputa eleitoral, votemos e discutamos, mas não comprometamos nossa identidade e prática doutrinária por causa dessa sopa de lentilhas chamada poder temporal.


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