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Editor: Carlos HB de Castro Magalhães (MTb 0044864/RJ)

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A decisão do ministro Alexandre de Moraes que impôs medidas restritivas em processo de grande repercussão política chama atenção não apenas pelo seu teor jurídico, mas sobretudo por elementos da sua linguagem: erros gramaticais, uso excessivo de exclamações, caixa alta e construções carregadas de indignação.

Esse contraste entre a forma (irregular, emocional e até agressiva) e o conteúdo (que deveria manter a sobriedade e a neutralidade próprias de um julgamento constitucional) revela muito mais do que meras falhas de revisão: constitui um vestígio involuntário do envolvimento pessoal do julgador no feito.

Essa conclusão surge pela aplicação do método indiciário, criado pelo historiador italiano Carlo Ginzburg, que propôs analisar fatos históricos e documentos não apenas por aquilo que afirmam de maneira direta, mas por meio dos rastros, sintomas e pequenos detalhes deixados involuntariamente – capazes de revelar dimensões ocultas, inconscientes ou não confessadas pelo autor.

Os rastros encontrados: erros, agressividade e pressa

Na decisão, encontram-se:

o uso de “mais” em vez de “mas” na frase em caixa alta e com cinco pontos de exclamação: “A JUSTIÇA É CEGA MAIS NÃO É TOLA!!!!!”;
erros de crase como “à favor” e “à partir”;
falhas de preposição e concordância como “a restrição a utilização as redes sociais”;
e erros de digitação, inclusive a repetição da palavra “corno’ no lugar de “como”, esse em despacho de outro feito.

Esses “desvios” não são apenas falhas mecânicas: na perspectiva proposta por Carlo Ginzburg, funcionam como indícios materiais (ou “sintomas textuais”) de um estado emocional intenso, incompatível com a serenidade exigida de um ato decisório da mais alta corte do país.

O contraste como sinal do envolvimento pessoal

A leitura indiciária revela que o julgador não está apenas decidindo de fora, como exige o sistema acusatório adotado pelo processo penal brasileiro. Pelo contrário, os rastros mostram que ele atua também como vítima direta, por se sentir ofendido pelos atos investigados; como acusador indireto, ao conduzir a investigação; e, finalmente, como juiz do próprio caso.

Essa fusão de papéis caracteriza justamente a lógica do sistema inquisitório, superado pela Constituição de 1988, que exige a separação entre acusação, defesa e julgamento para garantir a imparcialidade. Quando a decisão carrega emoção e indignação evidentes no texto, vê-se, por meio desses vestígios, que o julgador se afastou do distanciamento necessário.

O método indiciário como chave de leitura

Foi o método indiciário, criado por Carlo Ginzburg, que permitiu identificar essas contradições: ao olhar não apenas para o conteúdo declarado, mas para as falhas, deslizes e tons que escapam do controle consciente, percebe-se o grau de envolvimento subjetivo do ministro. Esse envolvimento pessoal transforma o ato técnico (julgar) em ato também emocional e político – revelando, assim, o fracasso do modelo inquisitório, que ressurge onde deveria imperar a imparcialidade.

Conclusão

Aplicando o método indiciário de Carlo Ginzburg, torna-se visível que o contraste entre a forma descuidada e o conteúdo punitivo não é um detalhe irrelevante: é um documento involuntário da presença do julgador como parte do conflito. Esses rastros textuais expõem o rompimento com o modelo acusatório e mostram como, sob forte carga emocional, a decisão assume traços do sistema inquisitório – modelo esse que não encontra respaldo na lei penal brasileira contemporânea.

Dessa forma, os erros de português e o tom indignado não apenas fragilizam a técnica do texto, mas funcionam como provas indiretas da parcialidade que decorre do envolvimento pessoal do julgador – evidência que só se torna visível quando lida pela lente do método criado por Ginzburg.


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