Por Carlos Magalhães, para o Blog Castro Magalhães
26 de julho de 2025 – O governo dos Estados Unidos, sob o comando do presidente Donald Trump, anunciou em 15 de julho de 2025 a abertura de uma investigação contra o Brasil com base na Seção 301 da Lei de Comércio de 1974, um instrumento que permite aos EUA investigar práticas comerciais de outros países consideradas “injustas” ou lesivas aos interesses americanos. A medida, conduzida pelo Escritório do Representante de Comércio dos EUA (USTR), inclui acusações de corrupção, desmatamento ilegal, pirataria, tarifas preferenciais a outros países e restrições a plataformas digitais americanas. Contudo, um novo elemento pode ampliar o escopo da investigação: a possibilidade de incluir crimes de lavagem de dinheiro por narcotraficantes e terroristas no sistema financeiro brasileiro, além de escândalos como o das Lojas Americanas, que poderiam ser interpretados como distorções ao comércio e prejuízos a investidores norte-americanos.
O que é a Seção 301 e por que o Brasil está na mira?
A Seção 301 autoriza o USTR a investigar práticas comerciais que violem acordos internacionais ou restrinjam o comércio dos EUA. No caso do Brasil, o USTR aponta questões como a pirataria na Rua 25 de Março, em São Paulo, o desmatamento na Amazônia (que daria vantagens competitivas ao agronegócio brasileiro), corrupção sistêmica, decisões judiciais questionáveis do Supremo Tribunal Federal (STF) e barreiras ao mercado de etanol americano. A investigação, com audiências públicas marcadas para 3 de setembro de 2025, reflete uma estratégia de pressão comercial e política, com Trump acusando o Brasil de práticas que prejudicam empresas americanas e citando um suposto déficit comercial – embora dados brasileiros mostrem superávit dos EUA desde 2009.
A decisão carrega motivações políticas claras. Trump tem criticado o STF por sua perseguição ao ex-presidente Jair Bolsonaro e decisões que ele considera censura a redes sociais americanas. Analistas, em plataformas como o X, sugerem que a investigação é uma forma de lawfare, combinando pressão econômica com objetivos políticos para forçar concessões do governo brasileiro ou desestabilizá-lo, especialmente no contexto do bloco BRICS, visto por Trump como uma ameaça aos interesses dos EUA.
Lavagem de dinheiro e fraudes financeiras: um novo foco?
Embora o foco inicial da investigação seja comercial, as acusações de corrupção e falta de transparência abrem espaço para incluir crimes financeiros, como a lavagem de dinheiro por narcotraficantes e terroristas no sistema financeiro brasileiro e escândalos como o das Lojas Americanas. Esses temas poderiam ser enquadrados como práticas que distorcem o comércio ou prejudicam investidores e empresas americanas.
Lavagem de dinheiro por narcotraficantes e terroristas
O Brasil enfrenta desafios com a lavagem de dinheiro oriunda do tráfico de drogas e, em menor escala, de atividades terroristas. Operações como a Rei do Crime (2020), que revelou movimentações bilionárias do Primeiro Comando da Capital (PCC) por meio de empresas de fachada, e a Operação Cryptoscam (2025), que desmantelou esquemas de lavagem via criptoativos, mostram a sofisticação desses crimes. Se o USTR considerar que a permeabilidade do sistema financeiro brasileiro a essas práticas cria um ambiente comercial desleal – por exemplo, prejudicando bancos ou fintechs americanas que operam no Brasil -, a lavagem de dinheiro poderia ser incluída na investigação.
Embora a Seção 301 não seja o instrumento típico para abordar crimes financeiros, que costumam ser tratados em acordos de cooperação policial (como entre a Polícia Federal e o FBI) ou no Grupo de Ação Financeira (GAFI), os EUA poderiam alegar que a insuficiência no combate a esses crimes afeta a competitividade de suas empresas. Por exemplo, bancos americanos poderiam ser impactados por concorrentes brasileiros que, intencionalmente ou não, facilitam a lavagem de dinheiro, criando distorções no mercado financeiro.
O escândalo das Lojas Americanas
O caso das Lojas Americanas, revelado em 2023, também pode entrar no radar da Seção 301. A fraude contábil de R$ 20 bilhões, envolvendo manipulação de balanços, insider trading e possíveis esquemas de lavagem de dinheiro, abalou o mercado brasileiro. Embora os acionistas de referência, como Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Herrmann Telles, não tenham sido diretamente implicados, a investigação da Polícia Federal aponta para ex-executivos que inflaram resultados financeiros com operações fictícias.
Para os EUA, o escândalo poderia ser relevante se o USTR argumentar que ele prejudicou investidores americanos (como fundos com ações da Americanas na B3) ou distorceu a concorrência no varejo, afetando gigantes como Amazon e Walmart, que operam no Brasil. A menção à corrupção no relatório do USTR poderia abarcar esse tipo de prática, mas a inclusão enfrenta obstáculos, já que o caso é tratado como uma questão interna pelo Brasil, sob a alçada da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e do Ministério Público Federal.
Como funciona a investigação?
O processo da Seção 301 segue etapas claras:
- Início: A investigação foi iniciada a pedido de Trump, com prazo de 45 dias para confirmação (já formalizada).
- Consulta pública: Até 18 de agosto de 2025, o Brasil e suas empresas podem apresentar defesas por escrito, com audiências em 3 de setembro.
- Análise: O USTR tem 12 meses (prorrogáveis) para investigar, negociar com o Brasil e avaliar evidências.
- Sanções: Se confirmadas as violações, os EUA podem impor tarifas, cotas ou proibições de importação, como as tarifas de 50% sobre produtos brasileiros já anunciadas para 1º de agosto de 2025. Exemplos históricos
O Brasil já enfrentou a Seção 301 no passado. Em 1985, os EUA investigaram a política de reserva de mercado para informática, levando à abertura do setor no governo Collor. Em 1987, a falta de patentes farmacêuticas resultou na suspensão de benefícios comerciais, com o Brasil cedendo em 1996. Outros casos incluem:
- Japão (1985): Tarifas de 100% sobre eletrônicos por subsídios a semicondutores.
- China (2018): Tarifas bilionárias por violações de propriedade intelectual.
- União Europeia (2020): Investigação por impostos digitais, suspensa após negociações. Consequências para o Brasil
As implicações da investigação são graves:
- Econômicas: As tarifas de 50% já anunciadas podem custar R$ 19 bilhões ao PIB, segundo a CNI. Novas sanções, caso lavagem de dinheiro ou o caso Americanas sejam incluídos, poderiam atingir setores como financeiro e varejo, além de agronegócio e etanol.
- Diplomáticas: A investigação agrava tensões bilaterais, com o Brasil rechaçando as acusações como intromissão. A ausência de um embaixador americano no Brasil dificulta negociações.
- Reputacionais: A inclusão de crimes financeiros ou fraudes como o da Americanas poderia minar a confiança de investidores estrangeiros no Brasil.
Se a lavagem de dinheiro ou o caso Americanas forem incluídos, os EUA poderiam exigir maior rigor regulatório do Banco Central e do Coaf, além de sanções a setores específicos. O Brasil, por sua vez, pode retaliar com a Lei de Reciprocidade Econômica (2025), impondo tarifas a produtos americanos, mas isso arrisca escalar o conflito.
Resposta do Brasil
O governo, sob o vice-presidente Geraldo Alckmin, planeja negociar para reverter as tarifas e sanções. O Brasil deve:
- Apresentar defesa técnica: Até 18 de agosto, demonstrar que combate crimes financeiros com operações como as da Polícia Federal e regulamentações do Coaf.
- Recorrer à OMC: Contestar a legitimidade de incluir crimes como lavagem de dinheiro na Seção 301, que é voltada para comércio.
- Fortalecer alianças: Engajar Mercosul e BRICS para contrapor a pressão unilateral dos EUA. Conclusão
A investigação da Seção 301 contra o Brasil é uma ferramenta de pressão comercial e política, com potencial para incluir crimes de lavagem de dinheiro por narcotraficantes e terroristas ou escândalos como o das Lojas Americanas, caso sejam vistos como distorções ao comércio ou prejuízos a investidores americanos. Embora muitos não vejam impacto direto da corrupção no comércio bilateral, a menção a tal prática pelo USTR deixa a porta aberta. Para mitigar os impactos, o Brasil precisa de uma defesa técnica robusta, negociações diplomáticas ágeis e apoio multilateral, enquanto lida com as tarifas de 50% já anunciadas. O desfecho dependerá da capacidade do Brasil de refutar as acusações e da disposição de Trump para negociar, em um cenário de crescentes tensões bilaterais.
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