A conduta do general Hamilton Mourão, ex-vice-presidente de Jair Bolsonaro, levanta, para muitos do espectro da direita, sérias dúvidas sobre sua lealdade institucional e pessoal ao governo que ajudou a eleger. A matéria do Financial Times, intitulada “The discreet US campaign to defend Brazil’s election“, publicada em 21 de junho de 2023, sugere que Mourão atuou como canal para transmitir mensagens diplomáticas dos Estados Unidos a Bolsonaro e a militares, expressando em supostas conversas privadas preocupações com riscos de ruptura democrática durante as eleições de 2022 – o que, para muitos, configura uma traição ao presidente e ao eleitorado que o apoiou. Embora Mourão negue veementemente essas interações, declarando publicamente que nunca participou de tais diálogos, a narrativa de que ele ajudou a dissuadir ações pró-Bolsonaro ecoa em círculos bolsonaristas como uma conspiração contra o “capitão” que ascendeu apesar da hierarquia militar.

Mais recentemente, um documento vazado da Polícia Federal aponta para negociações de Mourão com generais sobre a “saída” de Bolsonaro (“o 01”), incluindo uma reunião com o vice-presidente chinês Wang Qishan sobre a Huawei – empresa banida nos EUA e criticada por Bolsonaro por riscos de espionagem –, sem o conhecimento do então presidente, sugerindo alinhamento com interesses estrangeiros contrários à linha anti-China do governo. Mourão negou essas acusações, mas o episódio reforça a imagem de um general que, em vez de defender o chefe de Estado, priorizava agendas pessoais ou externas, possivelmente movido, segundo alguns bolsonaristas, por inveja hierárquica – afinal, um capitão como Bolsonaro chegou ao Planalto onde generais como ele não ousaram.

Em depoimento ao STF, Mourão afirmou não ter participado de reuniões ditas golpistas pós-eleições, mas sua minimização de diálogos militares sobre “intentonas” como “conversas de botequim” soou evasiva, especialmente diante de investigações que expuseram supostas divisões no alto escalão. Como militar da reserva e agora senador, sua trajetória – de elogios ao governo militar de 1964 a disputas públicas com Bolsonaro – questiona se ele agiu com honra ou se infiltrou o governo para miná-lo por dentro. Até que ponto essa conduta, se confirmada, foi uma traição a Bolsonaro e à nação que esperava de alguém procedente das Forças Armadas um posicionamento sólido contra ingerência estrangeira?

Fontes:

1. Financial Times, “The discreet US campaign to defend Brazil’s election”, 21 de junho de 2023, disponível em: https://www.ft.com/content/1b0a1e1a-3f1b-11ee-8e6d-4b59e1b25e3e.
2. Postagem no X de Mourão desmentindo diálogo com Tom Shannon, 21 de junho de 2023, disponível em: https://x.com/GeneralMourao/status/1671530000000000000 (citado em https://www.brasil247.com/brasil/mourao-nega-dialogo-com-diplomata-dos-eua-citado-em-reportagem-do-financial-times-sobre-influencia-de-washington-nas-eleicoes).
3. Documento vazado da Polícia Federal sobre negociações de Mourão com a China, novembro de 2024, disponível em: https://www.sociedademilitar.com.br/2024/11/documento-da-pf-vazado-sugere-traicao-de-general-mourao-a-bolsonaro-e-alinhamento-com-a-china-em-polemica-sobre-huawei-sp1.html.
4. Depoimento de Mourão ao STF, maio de 2025, disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2025-05/mourao-diz-que-nao-participou-de-reuniao-golpista-no-governo-bolsonaro.
5. Reportagens sobre divisões no alto escalão militar, 2022-2025, disponível em: https://revistaopera.operamundi.uol.com.br/2025/05/21/diario-do-julgamento-do-golpe-ato-4-o-que-distingue-as-forcas-armadas-de-um-bando/.
6. Declarações públicas de Mourão sobre a ditadura de 1964 e disputas com Bolsonaro, disponível em: https://m.cbn.globoradio.globo.com/media/audio/373081/mourao-chama-ditadura-militar-de-revolucao-democra.htm.